As recentes escutas de conversas entre o primeiro ministro e Armando Vara levantam uma boa questão que é a de saber se deve ser permitido, num dito Estado de Direito, usar escutas que revelam crimes quando surgem na investigação de outros crimes distintos dos escutados.
Há quem defenda que não. Mas como? interrogo-me eu. Devem então as autoridades fazer "ouvidos de mercador" e "passar à frente", como que dizendo, "oh que pena, não é este crime que procurávamos.. este foi terrível, grande malandro.. mas não conta, só andamos à cata de outro."
Está tudo louco? Parece que sim. Em nome do dito Estado de Direito, há quem defenda esta teoria.. mas o que é um Estado de Direito? Não me venham com as definições de Hobbes, Locke ou Maquiavel que eu conheço-as muito bem. A intenção era boa, mas a concretização da teoria é feita por habilidosos que criaram uma Democracia e um Estado que mete nojo. Não tem nada de Estado de Direito, é antes um Estado de direitos para "os meninos" e um Estado de Sítio para a população.
Perguntam pelo direito à privacidade? É obvio que defendo o direito à privacidade. Isso implica o direito a confessar crimes e a não ser punido por eles só porque apenas foram contados em privado e as autoridades não sabem... oficialmente? Sim, porque podem saber mas se não for oficialmente já não conta... já não foi crime, terá sido uma boa acção ou apenas uma acção inócua... Afinal, é a forma de a comunidade saber que um dos seus membros prevaricou que define se houve ou não prevaricação? Se ninguém souber, já não há crime? Se a comunidade e as autoridades souberem por determinado meio, também já não há crime? Apenas poderá haver indício de conduta incriminatória se se souber e aparecerem provas quando a autoridade andar especificamente à procura delas e dentro de regras muito apertadas?
É obvio que num VERDADEIRO ESTADO DE DIREITO o mal é sempre mal, quer se saiba quer não se saiba. Quer se saiba desta forma ou daquela. Quem faz mal à comunidade, tem de ser punido. A questão é haver provas. Se as houver, a punição tem de acontecer. Só assim há justiça.
A questão de saber como se encontraram as provas é irrelevante. Salvo como é óbvio, a tortura e atitudes do género que são de repudiar.
O ridículo de dizer que determinadas provas, como as escutas, já não contam porque não era à procura daquelas que andavam, ou porque não havia um mandato de um juiz para as recolher, revela toda a perversidade para encobrir os malfeitores da sociedade.
Toda a gente deve poder falar à vontade. As autoridades devem poder ouvir todas as conversas das pessoas. A privacidade é um direito relativo. Não é superior ao bem comum e ao combate ao crime. Para defender a privacidade de uma pessoa vamos prejudicar milhões de pessoas? A função das autoridades é essa, estar atentas, ver, ouvir, descobrir os crimes e os criminosos. O que ouvem e não constitui crime, não é relevante e ninguém vai usar isso para nada. A privacidade de uma pessoa "normal", é semelhante à privacidade de outra pessoa "normal". Só quem pratica más acções é que tem medo que descubram a sua privacidade.
Quem não cometeu qualquer crime, não vai confessar em público ou em privado que lhe deram um ou dois milhões de euros para autorizar certa coisa ou decidir um concurso... Só se for por brincadeira, por ironia ou porque é doente mental. Mas para isso é que existe a investigação... para ver se é verdade e aprofundar a investigação do crime que aquelas provam indiciam.
Além disso, qualquer pessoa que veja, ouça ou presencie actos atentatórios do Direito não deve denunciar? Deve encobrir? Deve calar-se? Quem cala consente.. "Tão ladrão é o que rouba como o que consente"..
Afinal não vivemos todos numa comunidade? Quem não cumpre as leis está a prejudicar os outros. Os cidadãos não têm direito a exigir que todos cumpram a lei?
Devem estar a pensar num Estado Polícia. Sim. Um Estado em que todos são polícias de todos é que funciona bem. Depois há os polícias profissionais e demais autoridades para averiguar, recolher provas e condenar se for caso disso.
Mas Portugal está, infelizmente, muito longe deste elevado nível de cidadania, democracia e de civilização.
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